MIT Media Lab: Design Transgressor

Por Daniel Campos

22 de março de 2011

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Aloha!

Esses dias atrás recebi um link do Felipe Tofani que me fez pensar em muitas coisas. Aliás, não somente eu,mas diversas pessoas pelo Twitter também deixaram suas impressões, opiniões e perguntas sobre a nova identidade visual do MIT Media Lab.

Fundado pelo professor Nicholas Negroponte do Massachusetts Institute of Technology em 1985, o MIT Media Lab é um dos mais reconhecidos centros de pesquisa do mundo. Seus funcionários trabalham em projetos que vão desde a interação humana com computadores até métodos de ensino para crianças e nanotecnologia. Provavelmente parte das mentes mais brilhantes dos nossos dias estão desenvolvendo suas pesquisas por lá.

E é para esse centro de pesquisas que o designer E Roon Kang e o estúdio The Green Eyl foram contratados para projetarem uma nova identidade visual.

O desenho faz alusão a três spots de luz que se encontram. Os designers então criaram um algoritmo que, baseado nos três spots mais 12 combinações de cores, criou nada mais do que 40 mil variações do logotipo. Não não, é isso mesmo: 40 MIL! O video abaixo dá uma noção de como tudo funciona.

A parte mais divertida: junto com tudo isso, foi criado uma aplicação web onde cada funcionário faz um login e lá escolhe uma das 40 mil opções. Depois da escolha feita, ninguém mais poderá usar aquela variação. Sim sim, o logo é exclusivo. Segundo algumas contas, isso dá ao MIT Media Lab mais ou menos 25 anos de cartões de visitas inéditos. Chique, não?


O desenho

“Combinação do cores mal feita, formas simples, gradientes de gosto duvidoso”. Algumas coisas que li sobre o logotipo. Olha, não posso discordar muito. Entretanto, quando se vai projetar um logotipo que você planeja 40 mil variações, formas e cores simples é quase que inevitável.

A combinação de azul, amarelo e vermelho me deu uma idéia de anos 80. Mas, apenas impressões como de qualquer outro ser humano. Contudo, tenho pensado ultimamente sobre essa questão do desenho numa identidade visual. Algumas conversas me fizeram ouvir coisas como “um logotipo tipográfico não funciona”. É claro que isso é uma bobagem (e assunto para outro artigo), mas essa frase vem do mesmo berço onde nascem outros conceitos, muitas vezes inconscientes, como por exemplo o de que logotipos que não tenham um desenho elaborado pertecem a uma categoria abaixo dos demais; ou que o designer que o fez não é um bom profissional. Frase como “até um macaco poderia fazer isso” são mais que presentes em muitas discussões (basta dar uma olhada nos comentários no BrandNew).

Muitas vezes, um logotipo é nulo sem estar incluso em seu mundo, em seu ambiente (o que chamamos de identidade visual). Um grande amigo, Emerson Duarte, uma vez me disse que muitas vezes um logotipo se resolve apenas em suas aplicações. Eu vou mais além: muitas vezes, um logotipo se resolve quando vemos ele trabalhando. E é bem isso que vemos acontecer. No movimento, na “inconstância constante” o logo do Media Lab revela sua personalidade. Seu carater visual não está em formas elaboradas, em combinações cromáticas modernas ou numa tipografia com extrema personalidade. Seu carater visual, aquilo que o identifica, é percebido por seu comportamento e não por traços imutáveis.

O desafio: ser mutante e reconhecível

O designer Dado Queiroz escreveu um email informal para amigos em 2010 falando sobre logos dinâmicos (mutantes, cambiantes, moving brand…). Coma permissão dele, publiquei aqui o texto pois, de alguma forma, achei pertinente ao assunto que estamos falando nesse post.

Há alguns meses escrevi um email a alguns amigos designers, com algumas observações pessoais sobre identidades dinâmicas. Deixo claro, antes de mais nada, que não há nada de novo no texto e que estou muito longe de ser um estudioso de branding. É só um apanhado de reflexões. Com isso dito:

Tenho pensado muito sobre identidades dinâmicas ultimamente e, com base numa pesquisa rápida e não muito concentrada que fiz hoje pela manhã, percebi que já é possível criar um logo verdadeiramente dinâmico.

Por exemplo, um logo que tenha a posição, forma, cor e transparência de seus elementos sempre variando (em movimento, mesmo) e influenciadas por variáveis externas, como o número de tweets sobre bicicleta os últimos 2 minutos ou a cor predominante em uma pesquisa no google images sobre o trending topics mundial ou fatores como umidade e temperatura atuais ou qualquer outra coisa (p.ex.: um countdown para um evento como a copa do mundo, a média de subida do nível do mar no mundo, o número de votos de um candidato ou até coisas mais focadas no usuário, usando dados de seus perfis online ou de configuração de sua máquina/celular/tablet… as possibilidades são infinitas).
Ou seja, online o logo pode estar sempre se movendo (a partir de variáveis coletadas, como nos exemplos acima, ou arbitrárias, definidas por alguém) e, em casos estáticos como print e papelaria, pelo que entendi é possível “imprimir” o swf alimentado por esses dados dinâmicos para um arquivo vetorial, “congelando” as variações em um dado momento.

Isso muda completamente o processo de projeto de uma marca. Completamente. O pensamento passa por uma espécie de 4ª dimensão, que seria o fator dinâmico. Que elementos serão afetados e como? Quais os limites aceitáveis de variação que podem ocorrer sem comprometer o senso de identidade da marca?

Imagine um logo de refrigerante (que abrange tanto mídias digitais quanto tradicionais, impressões com restrições etc). Em serviços baseados na web, é possível ter uma identidade dinâmica em uma espécie de loop (mas não exatamente um loop, pois as coordenadas sempre estariam variando, dentro dos tais limites aceitáveis). Em motion graphics que sejam fechados em si mesmos, pode ser um loop com dados arbitrários, aleatórios (definidos no momento da exportação) ou por amostragem (por exemplo, num comercial direcionado ao público X, o logo morfa a partir de variáveis relacionadas a esse grupo na época em que o produto atingiu um pico de vendas entre este público). Em print, pode também variar de aplicação para aplicação. E mesmo nas embalagens. Enquanto não há embalagens feitas de algum tipo de material similar a um papel digital, cada lote de latas, por exemplo, pode sair com um logo específico. Cada região demográfica pode ter um logo ligeiramente diferente, e isso pode ser alimentado automaticamente no arquivo de saída da arte.

A tecnologia para tudo isso já existe ao alcance de qualquer um de nós. Existe também, porém, a dificuldade de se coordenar tudo isso dentro de um ambiente complexo como uma multinacional. Mas será que é tão mais complexo? E, o que me parece mais urgente, existe também a necessidade de pensar os novos paradigmas a respeito do que consiste um logo.

O iPad é o primeiro passo de alguma coisa que ainda não sabemos muito bem o que é. Mas o que importa é que é um passo inicial, de algo novo. Acho que nunca as premissas do que constitui um bom projeto de marca (e de design em geral) estiveram tão em aberto. Isso é legal. É a chance de redefinir nossa profissão todos os dias, em sintonia com a grande revolução digital que estamos vivendo. Muito mais legal do que ficar preso a um punhado de mandamentos que alguém escreveu há 50 ou 60 anos que, apesar de ainda terem grande valor, foram pensados para uma época onde os paradigmas e as formas de comunicação eram rudimentares, se comparados aos nossos.

Dado Queiroz

Sendo bem direto: não importa a variação que eu veja desse logo, vou sempre saber que é o MIT Media Lab. E esse é o desafio dos que arriscam transgredir as regras. Wolf Ollins faz isso brilhantemente. Seu projeto para a Aol. que o diga. O design para a Oi também. Eu e você conhecemos diversas pessoas que se simpatizam com a identidade da Oi e que a reconhecem, não importando sua variação.

Mas Daniel, a Oi tem variações que talvez não chegam a 15 ou 20. O MIT Media Lab tem 40mil!

Sim, mas quem disse que, para um logotipo dinâmico funcionar é necessário xis variações? Exagero, pela quantidade? Talvez. Mas o projeto permitia esse exagero.

MIT Media Lab, The Green Eyl, Richard The, Casa da Música e Stefan Sagmeister

Muitos dos que viram o design acima, com certeza, se lembraram do projeto de identidade visual que Stefan Sagmeister fez em 2007 para a Casa da Música, Portugal. Não só pelo lado “aleatório”, mas também pelo uso da tecnologia, pois no trabalho para a Casa da Musica também foi criado um software, que eles chamam de Logo Generator, para seleção das cores do logotipo dependendo da aplicação. Pois bem: Richard The, sócio do The Green Eyl, trabalhou como designer para e junto com Sagmeister de 2000 a 2010.

Aos que não conhecem o design que estou citando, segue o excelente video de apresentação (indico que o veja em HD no próprio Youtube).

A finalidade justifica tal projeto?

Algo que li no BrandNew e que, até então não havia pensado, é no fato desse logotipo não ser feito para o mercado.

Vamos lembrar do que falamos no artigo do logo para as Olimpíadas 2016: no fim das contas, quem decide se o design é bom é quem vai consumir tudo o que o logotipo vai estampar. Nesse caso do Media Lab, podemos usar a mesma ideia.

Pense bem: não haverão produtos em prateleiras com esse logo; não haverão comerciais durante o SuperBowl; o logo não tem que vender o Media Lab; o centro de pesquisa não precisa de uma comunicação constante com o mercado para poder ganhar dinheiro e se manter viva; o logo não tem que vender nada nem ninguém. Ele vende a si mesmo.

E esse pequeno detalhe faz a diferença no resultado. Os designers, nesse caso, puderem pensar e criar algo que, bem provavelmente, conceitos de branding recriminam. Chico Homem de Mello diz algo sobre isso em seu texto de 2010 sobre o que pensava vir no logo das Olimpíadas 2016 (aliás, artigo que indico muito a leitura):

(…) Em palavras mais fortes: um projeto surpreendente é inviabilizado pelos princípios do brandingque comandam o processo de escolha da marca. Quando digo que o milagre não virá, não estou duvidando da capacidade dos designers selecionados para desenvolver as propostas. O ponto é outro: acredito que esses mesmos designers seriam capazes de propor projetos muito mais contundentes e inovadores se não estivessem engessados pelas leis que regem o branding e seus estratégicos arredores.

(…)

E onde entra o branding nessa história? Ora, o branding não seria exatamente o campo de conhecimentos capaz de articular projetos com essa abrangência? Seria, mas não é.

branding é fruto da lógica corporativa. Numa Olimpíada, estamos falando de esfera pública. Sempre é bom lembrar que nem tudo que é bom para o setor privado é bom para o setor público. (O que é bem diferente de dizer: ‘Se é bom para o setor privado, é ruim para o setor público’.) Aplicar o pensamento estratégico do branding na construção da identidade olímpica é projetar a lógica corporativa sobre a esfera pública.

No branding, não há espaço para a invenção; os resultados devem ser imediatos, objetivamente verificáveis. Melhor: mensuráveis. Ser mensurável é fundante no branding. Como a invenção não é mensurável…

Responderão os defensores do branding: “Errado! Um dos critérios a serem contabilizados na composição da nota de cada proposta é justamente a originalidade da solução’Esse critério contempla a manifestação da invenção, devidamente colocada a serviço dos objetivos estratégicos a serem alcançados”.

Critérios, contabilização, nota… Isso mesmo, estamos de volta à mensurabilidade: um elenco de critérios, os mais objetivos possíveis, que são contabilizados numa nota final, com o objetivo de obter do público-alvo as respostas adequadas frente aos objetivos estratégicos pretendidos. Captei a mensagem. (…)
LINK

PS: Antes de forma sua opinião sobre o que Homem de Mello disse, por favor, leia o artigo completo ok.

Guardadas proporções, estilos de trabalho, criação e contemplação do branding, concordo com o texto. E consigo aplicá-lo nesse caso do Media Lab.

O branding pode ser engessante. Talvez esse seja o paradigma a ser quebrado. Num projeto sem a necessidade de vender algo, as possibilidades se multiplicam, e ai o grande desafio não é ser criativo no fechado ambiente corporativo. É ser revolucionário num ambiente que pode permitir quase tudo. E, sem dúvida, isso é muito mais difícil.

Isso transgride o branding. Sim, mas revolução é bem por ai: transgressão de velhas verdades. Não sou coolhunter de logotipos mas acredito na evolução, em qualquer aspecto da existência humana. E é isso que nos conduz. A fotografia fez isso, o modernismo fez isso, o pós-modernismo fez isso, a Helvetica fez isso. Hoje, tudo o que fazemos, nossos próprios paradigmas, nossa cultura, nossas referências, nossas certezas, tudo isso é apenas uma síntese de 6mil anos de história. Com design não é diferente. Se é o futuro? Não sei. O que sei é que nada dura pra sempre. Até o que hoje consideramos o certo. Alguém vai transgredir isso em algum momento. E vai mostrar novos caminhos.

Eu sei que isso vai render uma boa conversa. Então, simbora comentar. O que pensam sobre isso?