Crowdsourcing e o Design Thinking

Por Luis Alt

3 de julho de 2012

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Ontem tive o prazer de participar de um painel sobre Co-Criação na Conferência de Crowdsourcing que está sendo realizada na Fecomércio. Tive um pouco mais de 10 minutos para falar e optei por utilizar meu tempo para falar sobre uma possível intersecção entre Design Thinking e Crowdsourcing, apresentando meu ponto de vista sobre o tema. Bom, sempre que posso, gosto de escrever um texto rápido para refletir o que direi em cada um de meus slides, quase como se estivesse dando a palestra, mas antes de que isso realmente aconteça. Um protótipo que geralmente guardo para mim, porém decidi compartilhar, na íntegra, o que escrevi para a palestra de ontem aqui com vocês …


 

Boa tarde, meu nome é Luis Alt e eu sou sócio-diretor da live|work, uma empresa global de inovação em serviços. Fomos fundados em Londres, no ano de 2001, e de lá pra cá temos trabalhado ao redor do mundo com projetos de inovação para grandes empresas auxiliando-as a colocar as pessoas no centro do processo de inovação. Estamos no Brasil desde o começo de 2010 e de lá pra cá temos realizado muitos projetos para marcas como Itaú, Bradesco, Whirlpool, Vivo e outras.

O que fazemos chama-se design de serviços, disciplina que comercialmente surgiu com os fundadores da live|work através de uma inquietude muito grande que eles tinham na época: ‘se os produtos atualmente são tão bem projetados, pensando nas pessoas que o utilizarão, por que os serviços ainda são criados de dentro pra fora nas empresas, cabendo a nós, clientes, juntar os grandes silos organizacionais para conseguir utilizá-los?’. A palavra design, em design de serviços entra pelo grande objetivo de todo projeto que fazemos: criar para as pessoas. É preciso colocar as pessoas no centro do processo de criação de novas ofertas.

A abordagem que utilizamos para a construção desses serviços mais centrados nas pessoas chama-se design thinking. O design de serviços é a aplicação do design thinking para a construção de serviços mais desejáveis, viáveis e rentáveis. Para quem nunca ouviu falar de design thinking, ele tem como pilares centrais a empatia, a colaboração e a experimentação.

Mas o que isso significa? Significa que eu preciso entender profundamente as pessoas para as quais eu vou projetar algo – no caso de um serviço, entender as pessoas que estão do outro lado do balcão mas também as que estão do lado de cá, pois são elas que serão atingidas pela implementação das soluções propostas e serão, dia após dia, as principais responsáveis por entregar a experiência que projetamos. Mas não basta apenas entendê-las, precisamos também envolver a todos nesse processo de construção de um serviço mais adequado para os clientes. Por que não? Por que não envolver os clientes e colaboradores na criação de novas soluções? Eles conhecem o que funciona, o que não funciona e o que poderia dar certo. E depois da colaboração, a experimentação aparece para nos auxiliar a visualizar o quanto antes, e de maneira rápida e barata, o que poderia ser feito – para melhoria, aprovação, rejeição, ajustes, etc. Experimentar nos permite enxergar o futuro sem perder muito tempo desenvolvendo tecnologias que talvez nem funcionem como havia sido planejado. É o famoso protótipo de experiências … Precisamos entender como seria a sensação de utilizar algo que não existe e para isso criamos contexto, ao invés de produzir exatamente tudo que imaginamos perdendo tempo e recursos.

• Só conseguimos encontrar boas oportunidades quando conhecemos muito da vida de poucas pessoas e não pouco da vida de muita gente •

Legal, mas o que isso tem a ver com crowdsourcing? Bom, é sobre colaboração. É sobre envolver as pessoas para construir algo novo. A principal diferença é que, normalmente, optamos por envolver menos pessoas em projetos. Isso porque entendemos que mais importante do que envolver muita gente, é importante envolver as pessoas certas e extrair muita informação delas. Como dizemos internamente, é melhor eu obter 1000 insights com 10 pessoas do que 10 insights com 1000 pessoas. Ao invés de receber informações muito rasas, vamos a fundo na vida das pessoas que envolvemos nos projetos, entendendo suas necessidades, desejos e barreiras através de uma abordagem mais próxima e estruturada.Estou dizendo que o crowdsourcing não é estruturado, ou que não funciona? Claro que não! Mas para que seja possível gerar soluções realmente inovadoras dentro de um processo de “extração das massas”, eu preciso criar uma estrutura que dê a elas contexto. Precisamos de inteligência coletiva, que é muito mais potente do que simplesmente uma massa opinante. Se olharmos para o comportamento das massas, veremos que a massa, como indivíduo nunca é igual à soma de suas unidades. Se olharmos para um estádio, por exemplo, veremos comportamentos na multidão que dificilmente se repetiriam de um indivíduo para outro. As massas são mais violentas, imprevisíveis e burras. As massas são instáveis. E a internet é uma massa também. Por isso se acessarmos qualquer portal de notícias hoje vemos comentários altamente ofensivos, entre pessoas que sequer se conhecem. Elas estão protegidas pela multidão. Elas acreditam que se perdem no meio dela.

Se olharmos novamente para o design thinking, temos dentro dessa abordagem algo muito importante: o double-diamond. Ele é uma generalização da maneira como encaramos um projeto. O mais importante aqui é que ou estamos gerando novas opções ou tomando decisões, nunca as duas coisas ao mesmo tempo. Estamos o tempo inteiro ou expandido, em busca de novas informações ou novas ideias, ou convergindo, procurando definir o que precisa ser feito e que tipo de informação ou ideia deve ser descartada. O crowdsourcing pode ser útil nesses dois momentos e existem exemplos claros de como utilizar a massa para gerar novas opções pode resultar em uma quantidade ilimitada de respostas a problemas expostos e também de como colocar as massas para escolher algo também pode ser útil. O problema é assumir que isso funciona sempre, e em qualquer cenário. Não podemos acreditar que disponibilizar uma caixinha de sugestões aberta na internet vai ser a resposta para nossos problemas, porque não vai.


• O diamante duplo nos ensina que ou estamos gerando opções ou tomando decisões, nunca as duas coisas ao mesmo tempo •

Voltemos aos pilares do design thinking. Falei pra vocês no começo que o objetivo de todo projeto é gerar soluções desejáveis, viáveis e rentáveis. Podemos ver da seguinte maneira então: precisamos criar coisas desejáveis para as PESSOAS, para criar soluções que sejam TECNICAMENTE viáveis e que sejam rentáveis para o NEGÓCIO. Eu preciso entender profundamente as pessoas, a tecnologia existente e o que é interessante para o negócio – qual sua proposta de valor, posicionamento de marca e uma série de outros fatores. A massa dificilmente vai conseguir entender qualquer um dos três. Vocês me dirão: “Mas a pessoa que está lá, dando suas sugestões, é o público.” Bom, as vezes, mas nem sempre … E aí temos dois impasses: 1. saber se a pessoa que está me dando a sugestão é meu público e 2. saber se a sua sugestão é realmente interessante para o negócio, porque mesmo ela sendo meu público-alvo, quem disse que o que ela está me dizendo tem algum valor real ou pode ser materializado em uma estratégia? Pois é …

Algo importante: não estou dizendo que o crowdsourcing não funciona. Muito pelo contrário, acredito que se criarmos um processo estruturado e, principalmente, colocarmos as pessoas dentro do contexto certo, os resultados podem ser interessantíssimos. Lá em 2004 auxiliamos a Orange na Inglaterra a estruturar um modelo aberto de inovação que teve ótimos resultados e ano passado criamos para uma empresa um desafio de inovação aberta. Poucas pessoas acreditavam no potencial do desafio internamente, mas ao criarmos um processo estruturado de inovação, com etapas claras onde elas precisariam entender as pessoas para as quais projetariam suas soluções e alcançar soluções tecnicamente viáveis e alinhadas com o negócio, conseguimos um alto nível de entrega e um alto interesse por parte dos funcionários. Ao final do processo, superamos em mais de 200% a meta de pessoas inscritas e as 10 soluções finais selecionadas estão sendo atualmente implementadas na organização, dando visibilidade às pessoas envolvidas e trazendo ótimo retorno financeiro para a empresa.

A colaboração e envolvimento de pessoas (clientes, fornecedores e funcionários) na criação de novas ofertas para as empresas está só começando e, felizmente, não existe apenas um caminho certo ou promissor. Estamos vendo movimentos com diversos propósitos pelo mundo, vários modelos e formatos sendo propostos. Cabe ao mundo empresarial testar, prototipar e achar a melhor maneira de conduzir seus projetos. Estou certo apenas de uma coisa: só há uma melhor maneira de fazer, e essa maneira é a colaborativa.

Obrigado
Luis Alt

2 de julho de 2012

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