Braskem: o desejo de não ser Odebrecht

Por Daniel Campos

17 de janeiro de 2018

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Aloha!

Sobre

A Braskem é a maior produtora de resinas das Américas, com produção anual de 20 milhões de toneladas, incluindo produtos químicos e petroquímicos básicos. Criada em 2002 após a integração de seis ativos de sua holding (Odebrecht), possui oito mil funcionários espalhados pelas 41 plantas industriais, das quais vinte nove no Brasil, seis nos Estados Unidos, quatro no México e duas na Alemanha.

Citação

“A nova marca Braskem simboliza nossa ambição de seguir evoluindo como um player importante do setor petroquímico global, atuando em constante progressão no desenvolvimento das pessoas e focado na entrega de soluções sustentáveis da química e do plástico a fim de melhorar o bem-estar e a qualidade de vida da sociedade.” Fernando Musa, presidente da Braskem

Design

CBA D+G [São Paulo – Brasil]

Imagens

Braskem redesign - LOGOBR

Braskem redesign - LOGOBR

Braskem redesign - LOGOBR

Braskem redesign - LOGOBR

Braskem redesign - LOGOBR

Comentário

Contextualizando

“Marcar uma nova fase.”

Com essas palavras o presidente da Braskem, Fernando Musa, racionalizou a mudança na marca da Braskem. Contudo não sejamos inocente: a nova fase a qual ele se refere diz respeito a distanciar a marca petroquímica da sua holding, Odebrecht.

Se você não esteve preso no Mundo Invertido nos últimos tempos, deve saber da Operação Lava Jato bem como da prisão de inúmeros empresários ligados a todo tipo de corrupção. Entre eles estava Marcelo Odebrecht, então presidente da empresa que leva o sobrenome da família. Em seus depoimentos, escancarou as relações criminosas da sua empreiteira com políticos. Não apenas Brasil mas outros países, como EUA e Peru, iniciaram investigações relacionadas as atividades da companhia. Acordos de leniência, multas, venda de ativos… Resumindo a história para a pauta que nos cabe aqui no LOGOBR: tudo isso destruiu a imagem do conglomerado e de todas as suas marcas.

Apesar de todo esse tufão dentro da companhia, os negócios precisam continuar. A primeira ação da empresa foi fazer um pedido de desculpas a nação. Anunciou seu Compromissos Com o Futuro em 10 passos/ações, uma espécie de agenda-ética. E depois, comunicou ao mercado que faria alterações na sua arquitetura de marcas.

Apesar do pedido de desculpas, o estrago estava feito. Boa reputação é algo que, se destruído, não pode ser refeito. Caso contrário, não se chamaria “reputação” (que tem haver com passado). Pessoas que perdem a reputação, geralmente, se mudam para outros lugares a fim de recomeçar. Com marcas… bem, não é tão simples assim. No fim, só restam duas opções:

  1. Ou muda a marca;
  2. Ou fecha as portas.

Telefônica fez isso. Trocou uma marca arranhada e odiada por uma marca mais cool, que desfrutava de algum prestígio (sim meu querido, a Vivo era da Telefônica. Sim, você continua sendo cliente da Telefônica, para sua e minha infelicidade). Diferente desse caso, a Odebrecht tinha um sério problema: uma arquitetura de marca quase 100% monolítica, onde o nome da holding assinava todas as unidades de negócio, graças uma estratégia de unificação liderada por Marcelo Odebrecht em 2013.

Arquitetura de marca Odebrecht

Quando tive aulas sobre arquitetura de marca na pós-graduação, Cecília Consolo nos dizia:

“Arquiteturas de marca monolíticas são mais baratas de se gerenciar, concentram foco, investimentos e imagem numa única marca. Contudo, se um dos negócios falhar, todos receberão o ônus.”

Exatamente. TODOS recebem o ônus.

No caso da Odebrecht, a coisa torna-se ainda mais pesado pois o nome do negócio é o mesmo nome dos líderes que foram presos e se revelaram criminosos confessos. Os danos são imensuravelmente maiores. É o nome da empresa, a todo momento, no noticiário, nas esquetes de humor no YouTube, nas páginas de corrupção. Se marcas com problemas bem menores, ou pelo menos não de ordem ética e legal, tornaram-se com o tempo quase que insustentáveis (Telefônica estou olhando pra você!), imagina a nossa querida e colossal empreiteira brasileira? Não tinha jeito, era (ainda é) necessário mudar.

A Odebrecht S/A (holding) não apenas anunciou as mudanças nas marcas do grupo, mas também liberou as unidades de negócio para fazer esse processo por conta própria, no tempo que quiser, numa evidente tentativa de fazer com que essas marcas alcancem sua própria voz e estilo (de preferência bem longe da Odebrecht). Ainda, as liberou para procurar novos sócios e parceiros, o que claro impacta nessas decisões também. Pelo que pude apurar, esse processo de repensar a(s) marca(s) Odebrecht está sendo liderado pela Interbrand SP.

Com excessão da primeira unidade de negócios da empresa, a Odebrecht Engenharia e Construção (empreiteira!), todas as demais passarão por mudanças a fim de distanciar suas marcas da Odebrecht. E quem inaugurou nova marca foi a Braskem, em agosto/2017. Curiosamente, o projeto foi da CBA B+G e não pela Interbrand. Talvez como efeito colateral da autonomia dada as unidades de negócio.

Quero abordar cada um dos projetos aqui no LOGOBR nas próximas semanas.

Agora sim, sobre a Braskem

Com a ausência do elo verbal comum aos outros negócios, coube a equipe de design começar pela remoção do elo visual criado em 2013: a cor vermelha. Para quem não lembra a Braskem usava um tom de azul, que foi aposentado em favor do “vermelho Odebrecht”, a fim de criar conexão da petroquímica com sua holding.

A partir disso, creio ser um projeto completamente novo. Tipografia atualizada, tirando de cena a sans com contraste e aquele terrível “A” a la Dax em favor de algo um pouco mais geométrico, sem contraste e com cantos levemente arredondados. O símbolo tenta manter alguma conexão com o anterior e sua “seta” interna, ao passo que se apropria do já usual sistema de cores degradê. Nada contra, apenas uma constatação. Sai o vermelho e entra o azul e amarelo, famosa paleta nas mãos dos Correios. Ao meu ver, essa cores tem um objetivo bem claro: criar conexão com os brasileiros. Apelar para o verde e amarelo seria pedante demais.

Nas aplicações, vemos algo que é competente, e só. Na verdade, as aplicações fazem com que esse projeto tenha cara de “design contemporâneo brasileiro de marcas”. É uma sensação que tenho em alguns projetos (por exemplo Vale e Correios), que acontece nesse também. O que não é demérito nenhum.

Conclusão

“Sua marca não é o que você diz que é, é o que o Google diz que é.” Marina Willer

Eu já devo ter citado essa frase um milhão de vezes aqui no LOGOBR. Passa ano, entra ano, mudam-se os trends, o branding evolui… mas continuo a acreditar que por ainda por um  bom tempo essa será uma verdade indelével: não adianta minha empresa falar que somos éticos se passo a ser sinônimo de anti-ética e crimes contra o patrimônio público e o bem coletivo. Danem-se missão, visão, valores, razão de ser, manifesto ou quaisquer outros pontos da plataforma de marca. Se eu não agir de fato orientado por esses valores, eles só serão textos vazios. E em algum momento, e esse momento sempre chega, minha marca será a personificação de uma grande farsa, e só me restará romper com tudo e começar do (quase) zero.

Não apenas falando sobre a tensão entre o que digo ser e tento transparecer vs. o que de fato sou e faço, esse redesign, bem como todo seu contexto que tentei resumir acima, é um grande exemplo sobre arquitetura de marcas e sobre como, querendo ou não, sua identidade verbal e visual sempre serão um gatilho de sentimentos, sensações e valores, serão sempre ídolos que sinalizam/identificam não o que você diz ser, mas o que as pessoas dizem.

Caso contrário, o vermelho ainda estaria com a Braskem.

PS: Obrigado pela dica para o post Marcelo Schneider Filho