O paradigma da leitura

Por Luis Alt

16 de março de 2012

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Quando os primeiros tablets e leitores digitais foram lançados, muito se discutiu a respeito da adoção desses produtos por parte das grandes massas para o consumo de livros. Uma das principais justificativas dos defensores do papel era de que “nada como folhear uma página ou sentir o cheiro envelhecido do papel”. Do outro lado, early adopters tecnológicos e ávidos leitores digitais defendiam que, assim como iPods, e-readers seriam capazes de carregar de um lado para o outro toda nossa biblioteca, dando-nos instantâneo acesso à livros, artigos e revistas.

A discussão partia geralmente do ponto de vista da função dos “produtos”, a grande questão sendo o que um e-reader apresentava como característica: “capacidade para armazenar 10.000 livros”, “tela (touch) de 14 polegadas”, “conexão ilimitada à internet”, “tecnologia de papel digital”, etc. No quesito tela, por exemplo, havia duas opções: tablets de um lado com telas que cansavam a vista e consumiam muita bateria mas tinham boa resposta ao toque e alto índice de resposta; tinta digital do outro com baixo consumo e zero índice de reflexão quando exposta ao sol mas relativamente lentas quando são necessárias transições rápidas.

Proponho agora um novo tipo de análise, tentando entender a vida das pessoas que utilizam esses produtos, enxergando o valor dos serviços por eles prestados. Por exemplo, uma crítica nesse sentido que existia na época, mesmo um pouco focada em aspectos tecnológicos, era de que ler livros em tablets não seria possível pois por ser uma tela que emitia luz, cansava a vista. A verdade é que essa eu nunca entendi, pois as pessoas que faziam essa crítica eram as mesmas que passavam horas diante de um computador, no trabalho e em casa, e que deixavam muitas vezes de ler um livro para passar mais tempo em msn, facebook ou qualquer outro site…

Sejamos diretos e vamos aos fatos, tentando entender os principais serviços que diferenciam um meio do outro (na minha opinião, claro.)

Livros Impressos

  • Toque: Nada como trocar de página! Realmente é algo que pesa muito para as gerações que viveram na “era do livro de papel.”
  • Zapping: O poder de passar rapidamente por várias páginas, folhear um livro e captar um pouco do que se trata sem a sensação de que estamos deixando algo de fora.
  • Exposição: “Diga-me o que lês e te direi quem és.” O poder de comunicar aos outros o que estamos lendo sem ter que falar nada, só uma capa de livro consegue (por enquanto).
  • Compra: Quem nunca entrou, ficou e se ‘perdeu’ em uma boa livraria? Passar uma tarde navegando por prateleiras de conhecimento é realmente uma experiência e tanto e a digital ainda não conseguiu substituir isso…

Livros em Tablets e e-Readers

  • Poder da Não-Decisão: Vai viajar e não sabe que livros levar? Sem problemas, basta ter um e-Reader que essa é uma preocupação que deixa de existir, já que podemos levar todos eles.
  • Anotações: Nada como grifar e anotar passagens de livro, certo? Mas melhor ainda é ter toda essa informação acessível, sempre. O Kindle já permite esse tipo de busca, o que torna anotações disponíveis e resumos automáticos.
  • Compartilhar: Compartilhar leituras (ou passagens) era algo que se fazia com considerável dificuldade (precisávamos participar de clubes de livro ou criar contextos em conversas). Hoje podemos ilustrar pontos e comentar passagens de textos com amigos e desconhecidos pelas redes sociais, em tempo real.
  • Continuidade: Amazon e Apple, por exemplo, nos permitem começar a leitura de um livro no iPhone, continuar no computador e terminar no Kindle ou iPad. De maneira integrada. Essa independência de aparelho nos dá muita flexibilidade.

A comparação, quando feita sob a perspectiva das pessoas que utilizam o serviço, ganham novas proporções e nos auxiliam a entender o que realmente é valorizado, ajudando a encontrar novas oportunidades em cada um dos cenários. Recentemente, por exemplo, durante o processo de escrever o livro Design Thinking Brasil, nos vimos imersos na criação do serviço do livro. Como, por exemplo, levar as referências adiante ou ajudar as pessoas que terminarem a ler o livro continuarem aumentando seu conhecimento sobre o assunto? Um simples “produto” livro virou um serviço, que além de transmitir conhecimento sobre o assunto foi complementado com um estudo de caso mais profundo, guia de próximos passos, conexão com profissionais da área, ferramentas de suporte em projetos, e assim por diante – tudo online. O livro, acredito eu, se tornou mais relevante porque pensamos nas pessoas que o leriam e, a partir disso, o recheamos de serviço feitos especialmente para elas.

Na live|work, acreditamos que no centro de tudo estão serviços, pois é aí que encontra-se o valor das coisas. No caso do grande duelo “livros impressos vs. digitais” minha resposta é que não há resposta. Os dois lados apresentam grandes vantagens, que podem ser vistas como desvantagens pela outra parte. Eu tenho um Kindle e gosto muito de levá-lo em minhas viagens. Por outro lado, sempre que penso em ler em casa corro direto para os “livros-livros”. Tudo não passa de ponto de vista, contexto, situação, momento. Ambos serviços me atraem e, sinceramente, não estou pronto ou disposto a abandonar nenhum dos dois. Quem sabe os únicos usuários que sobrarão no futuro serão os digitais, pois enquanto dificilmente novos serviços surgirão no papel, temos possibilidades infinitas de serviço nos aguardando no ambiente digital.

Até lá, fico com os dois!